quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

África Selvagem


TENTATIVAS DE FUGA
Hoje vamos conhecer três personagens, dois humanos, os tratadores Dominic Chinyama e Patrick Chambatu e Zabu, o macho alfa dos chimpanzés. Dominic está com a mão esquerda ferida e inchada e tem cicatrizes no braço direito. 

É comum o tratador vacilar no manejo com os animais e levar mordidas. Por causa da dor dos ferimentos ele estaria de folga, mas gentilmente foi ao trabalho apara atender a nossa reportagem. Ele trabalha há 18 anos no orfanato e diz que não troca de atividade por nada desse mundo porque se apegou aos chimpanzés e ama o que faz. 

Pergunto o que viu de mais interessante em sua rotina e afirma que a inteligência dos primatas é o que mais o surpreende e se recorda de três momentos. Lembra-se de um chimpanzé construindo uma escada com pedaços de madeiras para pular a cerca elétrica, outro cavando para escapar por um buraco sob a cerca e outro outro que lutou com violência para defender um chimpanzé mais fraco de um ataque. Interrompe sua lembrança acrescentando que são muitos os momentos ao longo de 18 anos e que teria que ficar um bom tempo narrando o que viu. 

Quero saber se Dominic já presenciou algum parto. Ele diz que quando vão parir as fêmeas seguem para a mata à noite e que é muito difícil flagrar esse momento, mas que teve a sorte de acompanhar o nascimento de um chimpanzé.

O SORRISO DO TRATADOR
Patrick é o tratador mais antigo do orfanato. Está aqui desde a inauguração em 1983 quando chegou Pal, o primeiro chimpanzé acolhido. O sorriso de Patrick é largo. 

O tempo todo ele revela a grande e branca arcada dentária. É felicidade pura estampada no rosto negro. Para ele não existe momento difícil no trabalho. Golias,  Renata, Regina.... 

À medida que atira comida para os chimpanzés ele pronuncia o nome de cada um e garante que sabe o de todos os 123 do orfanato. Pudera, são 23 anos convivendo com todos eles.

A chimpanzé Rita tem um bebê agarrado a ela o tempo todo. Patrick conta que ela teve gêmeos mas um morreu. Na hora de distribuir alimento ele dá atenção especial a ela e demostra todo o seu carinho. Patrick quer agradar os visitantes brasileiros mas não se dá bem. 

Fala que o Brasil tem o melhor futebol do mundo mas erra ao destacar que o nosso maior craque foi Maradona. Mostro meu descontentamento e corrijo afirmando que foi Pelé. 

Ele reconhece a falha e pede mil desculpas. "Sorry, sorry, Sorry". Assim como é costume dele, também abro um largo sorriso e com um aperto de mão me despeço da pessoa mais simpática que encontramos até agora em Zâmbia.



ZABU RESPEITA MULHER
Innocent Mulenga, o especialista em primatas, está com malária mas, mesmo assim, atende ao nosso pedido de entrevista para a televisão. São informações úteis para depois eu narrar as imagens que Felipe e Ingrid vão gravar. Juntos, observamos o comportamento dos chimpanzés e me impressiona como são parecidos com humanos nos momentos de carinho, violência, solidariedade, egoísmo e hierarquia.

Pará ilustrar o agir do amimais, Innocent conta a história de Zabu, o maior e mais forte chimpanzé do grupo e grande líder. O macho alfa tem 21 anos de idade e pesa 72 quilos. Nenhum chimpanzé ousa desafia-lo. Sua força e capacidade de liderança são incontestáveis para o bando. Zabu protege as fêmeas e os velhos. Se algum jovem tenta comer primeiro, o líder parte para cima aos murros e o guloso sai em disparada e aos gritos.

Innocent diz que antes o líder era Pal mas que Zabu se impôs depois de várias brigas violentas. Pal não era bom para as fêmeas. Além de não defendê-las, como deve agir um cavalheiro, elas ainda eram agredidas por ele. Zabu não gostava do que via, resolveu tomar controle da situação e declarou guerra a Pal que ergueu bandeira branca quando sentiu na carne que não poderia vencer a batalha. Durante o conflito as fêmeas apoiaram Zabu, o bom, e Pal teve que ser deslocado para outro bando.
Zabu, o líder justo, reina absoluto.




segunda-feira, 28 de janeiro de 2013


INTELIGÊNCIA PRIMATA
Finalmente uma noite bem dormida. Logo cedo, no rancho do orfanato para chimpanzés, o primatologista  Innocent  Mulenga dá uma aula sobre os "greats apes" (grandes mamíferos primatas) que são chimpanzés, gorilas, orangotangos, bonobos e seres humanos que não têm cauda. Não somos macacos. Macaco é o animal parecido com primata mas tem rabo.
Chimpanzé é muito parecido com humano, tem 98,6 por cento da nossa genética.

AMOR DE MÃE
É um bicho inteligente que utiliza as mãos e pedaços de madeira e gravetos como ferramentas para as necessidades diárias e demonstra, por sons e gestos, os sentimentos e as emoções. A gestação da fêmea é de oito meses, quase igual ao período da mulher. O filhote mama até os quatro anos de idade e depende da mãe até os cinco anos. A expectativa de vida é de 55 anos quando estão em cativeiro, mas vivem muito menos nas selvas da África porque são vítimas dos caçadores.

Igual a humano, chimpanzé guarda luto quando morre um animal do grupo. O sofrimento da mãe emociona qualquer coração quando ela perde um bebê. Durante dias o pequeno chimpanzé é velado no ninho no alto de uma árvore. Depois o bebê é enterrado pela própria mãe ou ela, com típica expressão da dor da perda, entrega para um funcionário do orfanato o corpinho do filho. A mãe chimpanzé, assim como as nossas, vai ficar triste por um bom tempo até que a rotina torne mais fácil suportar a dor da saudade.

SHEILA, MÃE DE CHIMPANZÉS
O Chimfunshi Orphanage foi criado em 1983 pelo casal Sheila e Dave Siddle. Ele morreu há seis anos. Ela, aos 81 anos de idade, continua em plena atividade protegendo animais vítimas de agressão do ser humano.

Sheila e a filha Sylvia recebem a equipe e reportagem com alegria. O aperto de mão da velhinha não é fraco e ela avisa com bom humor: "Cuidado, posso quebrar os seus dedos". Me admiro com a força da octogenária e respondo com um elogio: "Madame, she is a strong woman". De fato, aquela senhora é uma mulher forte.

A família de Sheila imigrou da Inglaterra para o continente africano em 1947. Ela era uma moça de 16 anos. Uma viagem de oito meses enfrentando deserto e selva. O destino era a África do Sul mas quando a família britânica chegou em Zâmbia se encantou com o lugar decidiu ficar. "Naquela época não havia guerra nem caçadores cruéis e tinha muito mais animais que nos dias de hoje", lamenta.

Antes de visitar os recintos onde ficam os chimpanzés ela nos recebe em sua casa repleta de fotos mas paredes. Imagens do marido Dave, filhos, netos, bisnetos e, é claro, de animais. Muitas de chimpanzés e de Billy, um hipopótamo que ela amava tanto quanto um filho. Sheila fica triste ao exibir um álbum de fotografias de Billy e se lembrar do animal porque ele morreu há menos de seis meses e a dor ainda não calejou em seu coração.


HIPOPÓTAMO NO SOFÁ
Billy é nome masculino, mas tratava-se de uma fêmea que foi resgatada quando era um bebê recém-nascido. A mãe foi morta por caçadores e a hipopótamo foi salva por um ranger que se chamava Billy Willyam. Quando o nome foi escolhido em homenagem ao herói que a salvou ninguém sabia que se tratava de uma fêmea e era tarde demais para mudar. Ficou Billy e pronto.
Hipopótamo é o animal mais agressivo e perigoso do continente africano, mas Billy não sabia disso. Criado desde bebê por seres humanos era dócil. Nos primeiros dias de vida tomava leite na madeira. Acostumou-se a dormir em um sofá que arriou as pernas quando o animal cresceu. Quando Billy morreu pesava 1500 quilos.

Sheila ironiza que Billy era um "bom católico" porque ele foi batizado e ficou quietinho durante o longo sermão de uma hora e meia. Quando Sheila resolvia passear de barco era um problema porque Billy também queria embarcar. Onde Sheila ia o hipopótamo seguia atrás. Se alguém se atrevia a demonstrar agressividade contra a mulher teria que se acertar contas com Billy. Para ele, ela era a líder do seu grupo e a defendia de todos os perigos.
Viemos aqui para falar de chimpanzés, mas Billy era a mascote do orfanato e Sheila se comove com o sofrimento de toda espécie de órfão e não nega abrigo.

PAL, A PRIMEIRA VÍTIMA
Pal foi o primeiro chimpanzé a ser socorrido em Chimfunshi. Estava ferido e traumatizado com as agressões que sofrera. A fama de Sheila e de Dave de dedicação aos animais se espalhou, não parou de chegar novas vítimas e hoje o orfanato abriga 123 chimpanzés, sendo que 70 deles foram resgatados e os demais nasceram aqui. Sheila gostaria de receber mais, mas, segundo ela, o dinheiro não é suficiente e o espaço para o conforto dos animais ficou limitado. A fazenda é de 25.000 acres e apenas 965 acres tem cerca eletrificada para garantir a segurança dos chimpanzés.


MÃOS FERRAMENTAS
Hora de conhecer os primatas de Chimfunsi. Chegamos na hora em que os tratadores vão alimentar os chimpanzés. A barulheira é de ensurdecer. Para o almoço os animais são confinados em recintos com grades e separados em quatro ambientes para evitar briga na disputa pela comida. Os mais jovens e mais fortes roubam o alimentos das fêmeas e dos mais fracos. A divisão facilita a partilha. Os 123 chimpanzés consomem o equivalente à carga e dois caminhões de alimento por semana. Comem frutas e vegetais e adoram biscoitos e balas de sobremesa.

É impressionante a habilidade dos chimpanzés com as mãos e os cinco dedos longos. Desembrulham balas e pacotes de biscoito, dividem ao meio a casca grossa da laranja do mato para servir de caneca na hora de beber água, manipulam gravetos para cutucar formigueiros, cavam, constroem ninhos e se atrevem a improvisar escadas com pedaços de pau. Parecem gente.
LARANJA SELVAGEM E IMPUNDU

Além de comprar a comida no comércio da cidade de Chingola, os funcionários do orfanato também colhem frutas produzidas na fazenda. Experimentei duas delas, bush orange, a laranja do mato africana, e impundu.

A laranja do mato tem a casca dura. Atirei fruta em uma parede para quebra-la. O conteúdo tem aparência de um cérebro formado por vários gomos. A polpa de cada gomo envolve um pequeno caroço e gosto é um pouco parecido com a nossa laranja pêra, não muito doce nem muito azeda. Gostei.

Impundu é uma fruta redonda e pequena com coroço e sabor que lembra um pouco banana nanica. Não é ruim. Os chimpanzés adoram tanto laranja do mato quanto impundu. Eles também apreciam um limão local de casca grossa e se deliciam com repolho. A comilança do almoço começa às 11h30 e dura mais de uma hora. Quando estão saciados os chimpanzés são soltos e, em bando, se embrenham na selva.

A VELHA DAMA E A SAUDADE
Sheila nos convida para um bate papo na casa dela. A conversa é longa. Queremos saber mais da vida dela mas é a protetora dos chimpanzés quem mais faz perguntas sobre a nossa equipe e sobre o Brasil. 

No canto da sala há uma televisão que raramente é ligada. A filha Sylvia, a nosso pedido, liga um velho vídeo cassete e exibe um antigo documentário em que uma das estrelas é Billy, a hipopótamo, e um dos personagens é Dave, o patriarca de morreu há seis vítima de enfisema pulmonar. Por alguns instantes Sylvia se retira da sala e Sheila pede para Felipe não gravar imagens dela naquele momento.

A saudade fala alto, as duas estão emocionadas e as lágrimas são inevitáveis.

Amanhã a gente volta porque ainda temos o que aprender sobre chimpanzés.





sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

África Selvagem


PESCADOR, PROFISSÃO PERIGO
A primeira visão da manhã no acampamento é de um homem varrendo as folhas que caíram das árvores. Noto que ele manca e logo desconfio que pode ter sido atacado por algum animal. Pergunto ao chefe dele que confirma minha suspeita. Mangomelo Phiri, 35 anos, casado e pai de três filhos, era pescador e quase perdeu a direita e a vida durante uma pescaria no rio Luawanga.

O ex-pescador, atual jardineiro, aceita gravar entrevista na margem do rio apesar de viver um grande drama até hoje, seis anos depois de incidente. Ele me conta que estava com os amigos jogando a linha para pescar peixe-gato quando aconteceu o ataque de um crocodilo gigante. O animal abocanhou sua perdeu e girou em torno do próprio corpo tomando a vítima na água.

Foi um grande desespero. Porém, um dos amigos dele reagiu com pauladas na cabeça do crocodilo que, por um curto momento afrouxou a dentada e Mangomelo conseguiu retirar a perna. O crocodilo avançou novamente, o pescador desmaiou, mas os amigos conseguiram salvá-lo. Mangomelo diz que quando acordou viu as luzes fortes de uma UTI de hospital. O estado de saúde dele era grave e o tratamento foi longo. Ele ficou cinco meses sem poder trabalhar e a esposa teve que trabalhar fora de casa para pagar o as despesas de uma clínica.

JOHN NUNCA VOLTOU
Mangomelo não é a única vítima dos crocodilos. Ele diz que conhece muitos outros pescadores que também sofreram ataques e que a maioria não teve a mesma sorte que ele e morreram.

Lembra que um primo dele, John, saiu para pescar e não voltou para casa. Ninguém sabe se ele foi vítima de crocodilo ou de hipopótamo. Admite que tem medo de voltar ao rio e que hoje está aqui na barranca para atender a nossa reportagem, lamenta que nunca mais mais voltará à antiga profissão de pescador mas conforma-se em ter um emprego como jardineiro para sustentar a família.

ÁGUA BEMBA
Nos despedimos de Mangomelo e partimos para o aeroporto de Mfuwe. Hora da partida para outras plagas. Decolamos às 12h30 quando o piloto Brad informou que serão pouco mais de duas horas de voo a bordo de um Cessna. Super Skywagon de seis lugares. Pousamos às 14h40 no aeroporto Kasompe, em Chingola. 

Ao sobrevoar a cidade notamos grandes empresas de mineração lá em baixo, inclusive a brasileira Vale do Rio Doce que extraí cobre e exporta para a China. Também chamou a atenção uma usina nuclear em plena área urbana. Percorrendo de carro as largas avenidas de Chingola me encantei com o casario. Grandes mansões se espalham pela cidade o que me faz acreditar que é o resultado da expressiva mineração, item número um da economia em Zâmbia.

Viajamos cerca de 2 horas até chegar ao local da próxima pauta, Chimfunshi, um orfanato de chimpanzés. Chimfunshi em dialeto Bemba quer dizer "lugar que tem muita água" e é dela que vamos beber. Porém, só amanhã, depois que o sol raiar.

Durante uma semana o trabalho foi intenso e com pouco tempo para descansar. Desde que decolamos em São Paulo não tivemos folga. Ingrid e Felipe vão direto para a cama e eu vou dormir mais tarde porque tenho muito o que escrever.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

África Selvagem


O REFRESCO DA CHUVA
Mesmo exaustos das longas jornadas de trabalho acordamos bem cedo. Quando o despertador do iPad soou às seis da manhã fui conferir as condições do tempo. Choveu durante a madrugada e as gotas d'água que eu ouvia de dentro do meu chalé caíam das árvores encharcadas. 

O céu estava encoberto por nuvens esparsas e a temperatura pedia um agasalho leve. Situação oposta ao calor intenso que suportamos nos últimos dias. Eu não tinha apetite para saborear a farta comida do café da manhã. Comi apenas meia fatia de pão com manteiga, tomei uma xícara grande de café e já estava pronto para as pautas do dia.

ELEFANTES ATACAM
Amon Mwale, 43 anos, casado, pai de três filhos, agricultor na vila de Kawaza vive um drama em seu pedaço de terra. Os elefantes viraram praga para a lavoura de subsistência. Problema comum entre todos os pequenos fazendeiros do vale do rio Luangwa. 

A superpopulação de elefantes famintos se tornou um pesadelo para quem depende da agricultura para alimentar a família. Com a seca que castiga as savanas os elefantes invadem as vilas e comem as plantações. Na época da cheia do rio são os hipopótamos que invadem as propriedades. Amon perdeu 60 por cento do milho que plantou e também viu os pés de algodão serem destruídos pelos paquidermes. 

Esta é a época das mangas. Os pés deveriam estar carregados mas os elefantes estão saboreando boa parte da colheita.


NINGUÉM DORME EM PAZ
Como a invasão acontece à noite as famílias que vivem na roça não conseguem dormir direito. Os adultos se revezam em plantões durante a madrugada para contra-atacar os elefantes que  se aproximam das lavouras. Amon diz que ele e a mulher se revezam durante a noite armados com tochas para espantar os animais. "Não dormimos em paz", lamenta o agricultor. 

Encarar os elefantes é perigoso porque eles atacam humanos e matam. Ele conta quem um vizinho, deficiente auditivo, quase morreu depois de um ataque de elefante. "Se salvou por um milagre", acredita.

Amon sabe que a solução é colocar cerca elétrica na propriedade mas, tanto ele quanto os demais pequenos sitiantes de Zâmbia não têm dinheiro para isso. Eles mal conseguem alimentar e dar educação para os filhos e não sobra para tal investimento. O agricultor sonha com a ajuda de alguma organização não governamental, como aconteceu no Malawi, país vizinho. Lá os pequenos produtores ganharam os materiais para cercar as pequenas fazendas.

PLANTÃO NOTURNO
Quando anoiteceu alguns agricultores se reuniram em volta de uma fogueira na vila de Kawaza. Ficamos com eles parte da noite mas, naquele pedaço do vale do rio Luawanga os elefantes não atacaram enquanto estivemos lá. Tivemos que voltar para o acampamento porque nossos corpos sucumbiam de cansaço. Não soubemos se os bichos apareceram. Mas temos certeza de que o pesadelo dos pobres agricultores não vai terminar tão cedo.


RECEPÇÃO KUNDA
Seguimos para outra comunidade da vila de Kawaza. Nos encontramos com Obbie Banda, um líder local. Pergunto porque tanta gente tem o sobrenome Banda, o mesmo de Mathews e Malemia. 

Ele responde que é porque são pessoas da mesma tribo. Os Kunda, que vivem ao leste de Zâmbia, são excelentes anfitriões. Fazem de tudo para agradar os visitantes. Logo na chegada as mulheres oferecem manga madura cozida. A fruta fica com gosto de doce de batata doce. Prefiro o sabor da manga apanhada no pé que deixa fiapos entre os dentes. 

Estou acostumado ao sabor que experimentei na infância. Ao ver uma menina trepada em uma mangueira não perco a oportunidade e também subo na árvore para apanhar a fruta. É a oportunidade de reviver meus tempos de moleque em Guaianás, distrito de Pederneiras - SP. Mas agora não há tempo a perder, o menino cresceu e não há tempo a perder trepado na mangueira porque tem que trabalhar.

ARQUITETURA TRIBAL
Obbie me guia pelo grande terreiro disposto a mostrar como vivem os Kunda da sua comunidade. Várias pequenas edificações feitas de adobe, madeira e palha formam as habitações. Poucas são de tijolos. A privada fica em um cercado de palha com uma fossa e um vaso sanitário de madeira no centro. Na entrada, sobre uma mesinha fica uma bacia com água, sabonete e um rolo de papel higiênico. O ambiente para tomar banho é separado e tem uma laje de concreto no meio para não sujar os pés no chão batido.

A cozinha é um construída em circulo, tem parede baixa de barro, estrutura de madeira e cobertura de palha. No chão, três pedras servem de suporte para panela com vãos para queimar a lenha. O quarto, também separado, pode ser circular, quadrado, retangular, de barro ou de tijolos, dependendo do recurso financeiro do dono. 

A sala é um quiosque com tapete de palha e cadeiras rústicas de madeira. Toda família tem silo para armazenar a colheita e galinheiro. Um deles me chama a atenção porque n?o abriga galinhas mas serve como casa para pombas. Obbie me surpreende quando afirma que os Kunda têm hábito de comer pomba e acrescenta que quando há harmonia entre eles e os visitantes a ave é servida como refeição. Ingrid faz careta diante da opção do cardápio e digo ao anfitrião que aceitamos o convite para o almoço mas preferimos galinha.



COMENDO COM AS MÃOS
Sentados em uma esteira de palha na sala de visitas circular esperamos pela comida enquanto chupamos manga cozida. Primeiro nos ofereceram sobremesa para depois servir o prato principal. 

As mulheres Kunda, trajando longos vestidos de colorido forte, se ajoelham para servir o alimento no chão. Purê de milho - base da alimentação no interior de Zâmbia -, refogado de folhas de abóbora, e frango cozido formam o prato do dia. Todos comem com as mãos. 

Ao nosso lado balde com água tirada do poço, sabão, bacia e toalha para o asseio após a refeição. Estava com o estômago gritando de fome e devorei um prato cheio com prazer.

O BATUQUE AFRICANO
Antes da nossa partida os Kunda reservam uma surpresa. Batuqueiros castigam seus instrumentos de percussão e mulheres com roupas multicoloridas cantam e dançam em um espetáculo típico africano. A alegria toma conta da tribo enquanto relaxamos sob os pés de manga à espera da digestão.



FANNY, A FEITICEIRA
Não muito distante dali vamos conhecer Hetina, ou melhor, Fanny Kazimete de 63 anos, uma velha curandeira respeitada pelos Kunda. Ela diz que em 1973 descobriu que era o instrumento de um espírito de nome "Hetina" que utiliza o seu corpo para curar pessoas. Com uma Bíblia nas mãos, vestindo gorro e vestido longo e brancos e um cajado também branco ao lado ela se acomoda em uma cadeira e diz que quer contar a sua história. O gorro e o vestido têm estampa em destaque de cruz vermelha. Ela fala em dialeto chinyanja e temos ajuda de um tradutor para o inglês.

Quero saber quem é Hetina. Fanny diz que Hetina vem do céu para ajudar as pessoas doentes. Afirma que somente ao tocar no enfermo ela já sabe qual é o mal que tem que ser atacado e que cura até mesmo ferido à bala em guerra. Segunda a velha, doentes mentais saíram do seu quintal sem a doença que os atormentava. 

Ela também garante que soluciona problemas estomacais, torna férteis mulheres que não engravidam e deixam potentes os homens que não conseguem satisfazer sexualmente as suas mulheres. Vai além e acrescenta que dispensa transfusões de sangue por causa do risco de contaminação pelo vírus HIV e serve a estes pacientes um chá avermelhado feito com um pedaço de madeira que ela colhe no campo. 

Em um pequeno galpão rústico que ela chama de farmácia há um estoque de raízes, troncos, cascas de árvores e uma variedade de pó que ela jura servir de remédio para aliviar os males das pessoas que a procuram.
Mesmo isolada naquele fim de mundo, sem energia e, consequentemente, sem televisão, internet ou qualquer outro aparelho eletrônico, Hetina, ou melhor, Fanny, pede à produtora Ingrid que envie a ela uma cópia da reportagem que gravamos em vídeo.

Para quem acredita em curandeirismo...






segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

África Selvagem

O BEBÊ ESTÁ MORTO

Nos despedimos da equipe que nos deu apoio no Zebra Park e partimos para uma viagem de 5 horas a bordo de uma Land Rover sem capota para observar melhor a natureza que teremos pela frente. Vamos ao Wildlife Park e temos certeza que encontraremos uma fauna sortida por onde passarmos.

Hiena, girafa, elefante, mongoose e javali - o Timão e o Pumba do filme "Rei Leão", búfalo, veado, babuíno são as espécies vivas que conseguimos filmar. Até aí só tivemos alegria, mas, encontramos a tristeza. Uma impala fêmea está morta sob uma árvore. Malemia, supõe que ela foi vìtima de ataque de um leopardo. 

Esse felino costuma arrastar suas presas para o alto das árvores para suas refeições, mas, segundo o nosso guia, algo ou alguém assustou o animal que abandonou o antílope no chão. Nos aproximamos tendo o cuidado de antes olhar ao redor e nos galhos da árvore porque certamente o leopardo está por perto e não quero servir de sobremesa. 

Quando pensei que já havia narrado tudo para a reportagem da televisão, Mathews me chama atenção para um detalhe que me deixa triste. A impala estava prenhe, prestes e ter seu filhote, e a pequena cabeça do feto estava para fora do corpo da mãe. Meu lamento logo se dissipou na reflexão de que aquela cena faz parte do mundo selvagem e que cada animal tem o seu papel, ou a sua sina, na cadeia alimentar.


LEÕES EM CLOSE

Nosso encontro com leões no dia anterior fui rápido e precisávamos de muito mais imagens das feras. Vimos abutres nos galhos de secos de algumas árvores. Eles seguem os felinos para ficar com as sobras da comida ou vice-versa, leões sabem que tem animal morto onde tem abutre. Uma pista importante e, não demora para encontrarmos o rei da selva e sua turma. Primeiro avistamos uma fêmea no leito seco de um rio. Preguiçosamente ela se esparramava pela areia. Às margens, mais duas fêmeas e um macho também curtiam sesta. Na sombra, os três  ignoravam nossa presença. Estávamos a bordo do carro e, teoricamente, em segurança. Mesmo assim nosso tom de voz era baixo e os movimentos eram lentos e calculados para não atrair a atenção das feras. Plano geral, aberto, close e big-close. Felipe e Ingrid "deitaram e rolaram". Tiverem tempo suficiente para encher o banco de imagens da TV Record.


A FAMÍLIA DO MATADOR
Depois de cinco horas de solavancos e vento na cara, a Land Rover estacionou em uma pequena vila de Mfuwe, onde vive a família de Mathews. Foi só alegria quando papai voltou para casa. Era visível de longe a arcada dentária estampada pelo sorriso das crianças. Depois de três semanas a mais de 120 quilômetros de distância, vieram esposa, filhos, pai, mãe e sobrinhos para recepcionar o nosso segurança. "Me dê dinheiro que estou precisando", brincou o velho pai em dialeto chinyanja. Todos sabem que quando o ranger retorna de uma temporada de trabalho traz o pagamento do patrão e as gorjetas no bolso. Mathews tem seis filhos e o dinheirinho é contado para alimentar tantas bocas. Penso que o pai dele, na verdade, não estava brincando quando pediu dinheiro. A pobreza campeia as vilas da tribo Kunda à qual aquela grande família pertence.

NOITE DE BICHO E TEMPESTADE
Nos despedimos do nosso ranger e dos seus parentes e seguimos para a etapa seguinte da nossa aventura. Mal desembarcamos nossas mochilas em novo acampamento, o Wildlife Camp, e saímos para um safari noturno. Filmamos apenas alguns animais. 

Quando estávamos à procura de um leopardo tivemos que encerrar o trabalho. Uma chuva torrencial interrompeu as gravações anunciando que o período de seca está chegando ao fim. A tempestade chegou com clarões de relâmpagos e estrondos de trovões. 

Era tão forte que tivemos que proteger os equipamentos e nos cobrir com capas impermeáveis que resolveram parcialmente o problema. Chegamos no acampamento em sopa quando os relógios marcavam 11 da noite. Havíamos acordado à seis da manhã. Foram 17 horas de trabalho apenas com curtos intervalos para as refeições. Dia longo e cansativo mas muito produtivo. Valeu!

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

África Selvagem

O RANGER JÁ MATOU

Hoje despertamos meia hora mais cedo para conhecer a rotina do "ranger" Mathews. Ainda estava escuro às 4 e meia e ele já escovava as botas e separava os apetrechos para limpar e lubrificar o seu rifle. No rádio de pilha, companhia diária dele, o locutor falava algo em dialeto Chinyanja que jamais serei decifrar. Pensei em pedir para que desligasse o aparelho para uma entrevista, mas preferi que aquele som radiofônico continuasse enquanto Felipe e Ingrid gravavam imagens de apoio. Era natural, fazia parte da rotina dele e eu não poderia interferir na realidade.

O ATIRADOR E A BARBIE

Além das ondas sonoras, outro detalhe me chamou a atenção. Mathews, homenzarrão com mais de 1'80 m de altura cobria a cama com um lençol estampado com bichinhos. Um ursinho se destacava entre os desenhos. Me surpreendi ainda mais quando ele me mostrou o travesseiro. A fronha era da Barbie. Homem casado, pai de seis filhos, Mathews explicou que o
lençol e o travesseiro eram as únicas coisas que trouxera de casa para se lembrar das crianças.
Ele trabalha isolado naquele fim de mundo durante três semanas e folga uma. E a saudade bate forte. "Não é fácil, mas eu e minha família tivemos que nos acostumar", consola-se o ranger. Afinal é a forma que ele encontrou de ganhar o pão.

O atirador Mathews nunca se separa de seu rifle.

MATAR PARA NÃO MORRER
O segurança de aventureiros que se embrenham nas savanas é ranger há 14 anos. Nesse período teve que matar hipopótamos, elefantes e búfalos. Porém, deixa claro que foi para defesa de seres de humanos ou porque quando um animal selvagem mata um homem tem que ser abatido. Aconteceu na própria família. O tio foi morto por um elefante e Mathews teve que liquidar o bicho.
Quero conhecer a família dele, mas essa visita tem que ficar para outro dia porque agora temos trabalho pela frente. É hora de mais uma longa caminhada.

GIRAFA NÃO "FALA"
Nosso primeiro encontro é com uma família de girafas. Descubro que elas não emitem sons e que a comunicação é feita com os olhos. São desengonçadas ao andar, mas têm uma beleza particular. A família nunca se separa. O macho é maior que a fêmea e de um colorido mais exuberante. Já a fêmea tem a cabeça maior. Os filhotes que ainda não alcançam as folhas para
saciar a fome mamam nas tetas de suas mães. São bichos ariscos quando estão na natureza e não permitem que nos aproximem muito. É lindo de se ver, mas hoje o maior objetivo de nossa equipe é procurar por leões. Haja adrenalina.

Bebê girafa mama enquanto não alcança os galhos da árvore.


O REI ESTÁ PERTO
Mathews e Malemia seguem os rastros que se misturam nas trilhas. Conseguem identificar os animais pelas pegadas e dizer há cerca de quanto tempo eles passaram pelo caminho que seguimos. Sabem que hienas seguem leões para comer a carniça deixada pelos felinos. Marcas grandes no chão batido indicam que não estamos longe do que procuramos. Pensar que
poderemos ficar frente a frente a com as feras me leva a questionar se encontrá-los é bom ou ruim. É claro que é bom para a reportagem. Mas, e se eles estiverem famintos? Não é possível que passem fome com tanta comida à disposição. Então, vamos ao trabalho.

MEDO E FELICIDADE
O rastro dos leões começam a ficar mais frescos. Eles estão bem perto, talvez menos de um quilômetro, calcula Malemia. A partir de agora nosso deslocamento tem que ser silencioso.
Mathews caminha com a arma pronta para disparar. Seus olhos estão atentos e a audição aguaçada. A expectativa aumenta. O nível de adrenalina sobe. De repente, Mathews aponta para a moita à nossa frente e sussurra: "Lions". Tudo acontece muito rapidamente a menos de dez metros de distância. Ouço um urro assustador, o coração bate muito mais forte e um misto de medo e alegria confundem meus sentimos e emoções. Os segundos demoram a
passar. Estamos muito perto de uma família de leões que, mais assustados que nossa equipe, foge e desaparece na savana. Tudo acontece muito rapidamente.

TEMOS IMAGEM
Pergunto a Felipe se ele conseguiu gravar pelo menos um leão. A confirmação vem mais tarde ao checar o material. Sim, temos o bicho, mas por apenas alguns segundos. E editor terá que usar o recurso de câmera lenta ou frisar a imagem. Parece pouco, mas, registrar esse encontro na natureza não é fácil. Estamos em um local selvagem, não em um zoológico. Só quem já fez
safari a pé sabe do que estou falando.
No período da manhã foram oito horas de caminhada sob um sol de derreter a alma. Vimos muitos outros animais, mas o encontro com os felinos foi o grande momento.

Chegamos bem perto do rei.


SEXO PROIBIDO
Quatro da tarde, o calor é mais ameno mas mesmo assim o suor escorre pelo corpo. Saímos à espera de surpresas e novos conhecimentos sobre a vida animal. Notamos que um hipopótamo está isolado de um grupo de cerca de 30 animais. Malemia explica que ele foi expulso porque tentou namorar a mulher de outro hipopótamo. Também registramos a chegada de um elefante às margens do rio Luawanga. Trata-se. Outro solitário que também tentou pegar, ou pegou a mulher do próximo quando o próximo estava próximo e se deu mal.
Como ele vive isolado da sua manada, aquele jovem elefante é muito mais agressivo que os demais porque tem que se defender sozinho naquele território hostil.

O hipopótamo namorador foi expulso do grupo.


PERFORMANCE TRIBAL
Foi um dos dias mais cansativos até agora. Caminhamos ao todo cerca de 12 quilômetros, mas valeu a pena. Só o encontro com os leões pagou o sacrifício.
Terminamos a dia com um bom jantar ao ar livre e, depois da sobremesa, uma grata surpresa, os funcionários do acampamento, liderados pelo chefe de cozinha Moffat, entram em cena sorrateiramente e apresentam um espetáculo de música e dança com gingado típico da África.
A coreografia e o som tribal do coral zambiano é o alívio para um o fim de um dia de trabalho tão cansativo.







quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

África Selvagem



ELEFANTES NA TRILHA
Nossas caminhadas pelo parque têm que ser no início da manhã e no final da tarde. De 11 horas até 4 da tarde o calor é insuportável até mesmo para os animais que se abrigam nas sombras das árvores e em seus esconderijos. A temperatura passa de 40 graus Celsius mas a sensação térmica é muito maior. Parece até que vamos derreter. Mesmo de manhã e à tardezinha não é fácil trabalhar nessa fornalha.

Nosso primeiro encontro foi com elefantes. Nossa equipe gravava imagens de apoio de impalas, os irmãos dos veados brasileiros, quando foi surpreendida pela passagem de uma manada de elefantes. Esses animais parecem dóceis mas podem atacar se foram ameaçados. Sabemos que é preciso manter uma distância segura. Ver elefante no circo é uma coisa. Encará-lo em seu hábitat é outra. Por isso, com cautela, documentamos a passagem de uma família inteira. Esperamos pacientemente que eles liberassem o caminho. Nosso desejo maior era gravar imagens de leões. Será hoje o dia desse encontro desafiador?


                                                            

O ÉBANO E O FOGO
Seguimos, sempre em filha indiana, com o ranger à frente. Ele também é mateiro e tem facilidade para identificar pegadas e dizer a espécie do animal e há quanto ele passou por determinado lugar. Malemia, o segundo da fila, também é bom no assunto e sempre tem uma informação útil.

As caminhadas são longas e cansativas e de vez em quando é preciso parar para descansar. Hora de tomar chá ou café com biscoito. Um homem que nos dá apoio tira da mochila uma chaleira, junta gravetos e folhas secas e vai acender o fogo. Mas não temos fósforo nem isqueiro. E agora? Para os africanos de Zâmbia isso não é problema. Uma vareta fina de madeira mole é friccionada em um pedaço de ébano, madeira nobre e dura. 

Rapidamente temos fogo para o nosso lanche. Antes da partida temos o cuidado de ter certeza que não ficou nenhuma brasa para evitar incêndio na savana.

No trabalho da manhã encontramos várias espécies de animais, mas voltamos frustrados para o acampamento porque a grande expectativa era ver leões. Quem sabe amanhã.
 Vermelho carmim é a cor que domina


PÃO NO BURACO
No intervalo de descanso aproveitamos para gravar um pouco mais. Desta vez para matar minha curiosidade. Quando chegamos nos ofereceram pão fresco. Perguntei como isso era possível em local tão remoto e me responderam que era feito aqui mesmo, em um "buraco". Entrevistei o chefe de cozinha, Moffat Gondwe e ele me explicou que, depois de preparar a massa, deixa a forma ao sol quente cerca de 30 minutos e depois leva ao buraco em brasa, coberto por uma folha zinco por mais 30 minutos. O resultado é ótimo.

TRAVESSIA COM CROCODILOS
Às 4 da tarde é hora caminhar novamente. Nossa equipe tem que atravessar a pé o rio Luangwa, moradia de crocodilos famintos e traiçoeiros. Tiro as botas, minha calça cargueira se transforma em bermuda e o ranger engatilha o seu rifle. Antes da travessia ele acena pedindo um minuto para observar se há movimento suspeito ao redor. Mathews autoriza a travessia. O rio está raso pelo castigo da seca o que facilita seguir rápido para a outra margem para evitar o pior. Não senti medo mas pensei que na volta vai estar escuro e a equipe vai ter que atravessar o Luangwa de volta ao acampamento. 

Seja o que Deus quiser.


CARMIM COME ABELHA
Um babuíno divertido está em nossa trilha. Gravamos imagens do engraçadinho mas temos que ir adiante logo para chegarmos antes do pôr do sol onde estão centenas de ninhos de um pássaro muito bonito, o "Carmim Comedor de Abelha do Sul" que tem esse nome por causa do vermelho carmim que é a cor dominante, porque come abelha e porque vem do sul do continente africano. Além do vermelho carmim, o azul turquês e a cor laranja dão um colorido especial à ave.

O PÁSSARO IMIGRANTE
O curioso é que a fêmea põe os ovos em um ninho encravado no barranco do rio Luangwa que nessa época tem seu nível muito baixo por causa da seca. Quando chegarem as chuvas torrenciais o rio vai subir e os ninhos serão inundados, mas os filhotes já estarão aptos para voar. Então, em bando, os belos pássaros vão imigrar para a Botswana e para África do Sul. Demos sorte, chegamos no início da temporada das chuvas e pudemos apreciar tamanha beleza. E mais, encerramos as atividades do dia contemplando um colorido único no céu. Coisas da Mama África.
Os ninhos são no barranco





terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Caminhada Selvagem


Despertar às 6 horas da manhã em Lusaka, capital de Zâmbia, África austral. Eu, o cinegrafista Felipe Meireles e a produtora Ingrid Sachs vamos voar para Mwanya, região nordeste do país. Serão duas horas a bordo de um pequeno avião, um Cessna 337 D de quatro lugares. O piloto Edmond avisa que a viagem poderá demorar um pouco mais porque o voo vai ser contra o vento. Depois, são mais uma hora e meia de carro para o nosso primeiro safari no South Luangwa Park, próximo a Mukasanga, onde vive a tribo Pisa. Primeiro vamos ao Zebra Santuary Plains Camp onde vivem livremente animais selvagens de várias espécies, como leão, leopardo, hipopótamo, crocodilo, elefante, girafa e impala. Vai ser um dia longo.

Os animais são livrs no South Luangwa Park.

Para chegar ao acampamento onde vamos dormir três noites temos que atravessar o rio Luangwa, frequentado por crocodilos, em uma canoa. Somos recebidos por Malemia Banda e pelo "ranger" Mathews Banda que nunca se separa do seu rifle calibre 375, arma com poder de fogo para derrubar um elefante adulto com um só tiro. Logo saímos para um safari a pé. A pé? Normalmente os safaris são feitos a bordo carros, por questão de segurança. E estamos em território hostil. Leões, leopardos, hipopótamos e muitos outros bichos bravos vivem aqui. Esse novo desafio é motivador. E lá vamos nós. A pé!


Primeiro avistamos antílopes aos bandos, babuínos, crocodilos e perigosos hipopótamos se refrescando do calor de 40 graus no leito baixo do rio. A presença da nossa equipe deixa os animais estressados. É preciso ter cuidado para evitar um ataque. Eles têm aparência dócil mas são perigosos. Parecem lentos mas são velozes. Matews, o atirador, está sempre à frente para evitar o pior e chegamos o mais próximo possível para captar imagens.


Zâmbia tem superpopulação de hipopótamos.

Quando o sol se põe é hora de voltar ao acampamento. Jantamos à luz de velas às margens do rio Luangwa e nos recolhemos para as nossas barracas. Aliás, que barraca! Lâmpadas acesas por energia solar, privada com descarga, chuveiro, shampoo, condicionador, sabonete líquido e mosquiteiro cobrindo a enorme cama de casal. Temos que dormir cedo porque aqui, todos os dias, o nosso despertar será sempre às 5 horas da manhã. Antes que o sono me apague, escrevo este texto e em seguida vou ler algumas páginas do livro "Não há dia fácil", de Mark Owen, militar norte-americano que estava na equipe que matou Osama Bin Laden.

Amanhã vamos procurar leões. Espero que o nosso "ranger" não tenha que entrar ação.




segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Berçários Selvagens de Zâmbia



No saguão do Aeroporto Internacional de São Paulo encontrei Felipe Meirelles, câmera um, e Ingrid Sachs, câmera dois, contratados da Baboon Filmes, produtora parceira da TV Record em grandes reportagens. Destino, Zâmbia, na África austral, país sem costa marítima que tem como vizinhos de fronteiras Congo, Tanzânia, Malawi, Moçambique, Zimbábue e Namíbia. Diferentes grupos étnicos de Zâmbia falam 70 dialetos regionais. O inglês é o idioma oficial. A exportação de cobre é a principal atividade do país que tem poucos ricos e uma imensa maioria pobre. Porém, vamos atrás de outra riqueza, a vida selvagem espalhada por berçários naturais. Vamos chegar bem perto de animais ferozes e viver uma aventura que só é possível nas savanas africanas. Nosso objetivo é revelar o comportamento animal em território hostil onde a luta pela vida faz parte da rotina. 

Viagem pela cultura e pelo mundo animal da África.(foto Ingrid Sachs)

Também queremos conhecer um pouco da vida dos africanos de Zâmbia. Vamos mostrar como é viver em terras onde há a lei da selva, ataques de animais e atos predatórios do bicho homem, o mais letal para a natureza. Nas vilas, nossas câmeras vão invadir a privacidade de tribos e registrar hábitos e costumes de um povo dócil e amigo. Nossas lentes vão documentar em big close leões, elefantes, hipopótamos, crocodilos e muitas, muitas outras espécies pelos nossos caminhos. De Guarulhos e Johanessburg serão quase 10 horas de viagem. Mais duas horas e meia de voo, depois de uma conexão no aeroporto da capital da África do Sul, vamos pousar em Lusaka, capital de Zâmbia. Mesmo depois de uma longa viagem e sentindo os males do fuso horário de quatro horas, na manhã seguinte, segunda-feira, vamos começar a desbravar os berçários selvagens do país, partindo em um avião pequeno para o Parque Nacional de Luawanga. Nosso primeiro encontro animal vai ser no Zebra Camp em um desafiador safari a pé. Então, o bicho vai pegar.